reformula o atual modelo de polícia.
A proposta é avançada e pretende corrigir destacadamente duas distorções: a
absurda partição do ciclo de policiamento e a inexistência de carreiras únicas
em cada instituição policial.
Explico: em todo o mundo civilizado cada polícia atua desde os serviços de
patrulhamento até as tarefas de investigação. Como regra, os patrulheiros atuam
uniformizados e os policiais dos departamentos de investigação se dedicam ao
esclarecimento de crimes. Estas duas dimensões básicas do trabalho policial
conformam o chamado “ciclo de policiamento” e estão presentes em todas as
polícias do mundo, menos no Brasil. Aqui, por razões históricas, optamos pela
partição do ciclo, atribuindo à Polícia Militar (PM) o patrulhamento e à
Polícia Civil (PC) a investigação, razão pela qual não temos duas polícias em
cada estado, mas duas metades de polícia. É esta divisão do ciclo a responsável
pela persistente hostilidade entre as duas polícias que, como regra, não dividem
informações, não compartilham recursos e alimentam infinitas disputas de
prerrogativas. Não satisfeito em criar estas metades de polícia, o modelo
vigente ainda produziu um segundo “corte”, desta vez horizontalmente dentro de
cada instituição. Nas PCs, o corte se dá entre delegados e não-delegados e na
PMs, entre oficiais e não-oficiais. Cada uma destas camadas se organiza a
partir de interesses específicos e mecanismos de seleção diferentes e, entre
elas, há enormes desigualdades salariais, de poder e prestígio. Como resultado,
temos instituições fraturadas, que não oferecem aos policiais uma carreira de
verdade; motivo pelo qual as polícias brasileiras nunca completam seus
efetivos. Também aqu i, nosso modelo é único. Em todo o mundo, há uma só carreira
em cada polícia. Assim, nas democracias avançadas, todo o chefe de polícia terá
sido patrulheiro, porque todos os policiais iniciam no serviço rotineiro de
patrulha. Depois, na medida em que dão mostras de suas capacidades, vão
progredindo na carreira.
No Brasil, não temos, ainda, sequer um campo autônomo da segurança pública.
Nossas duas metades de polícia se originam de outros dois “campos”: as PMs, do
campo da Defesa e as PCs, do campo da Justiça. As primeiras, espelhadas no
Exército, foram vocacionadas para a guerra; as segundas, espelhadas no
Judiciário, foram vocacionadas para os tribunais; o que faz com que, ainda
hoje, muitos policiais se imaginem “guerreiros” ou “juízes”. Também por estes
mitos, não avançamos na constr ução de polícias democráticas e eficientes.
Neste quadro, a PEC 51 desconstitucionaliza o modelo de polícia, permitindo que
Estados e Municípios sejam protagonistas na definição das polícias que desejam.
Uma boa noticia, em síntese. Talvez o Brasil também tenha acordado para a gravidade
do tema e se tenha criado a oportunidade de discutir o cesto ao invés das
maçãs.
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